Era uma vez o ano de 1967.
Era uma vez um país cinzento, cinzento, cinzento.
Era uma vez um dilúvio que se abateu sobre esse país.
Era uma vez um silêncio de chumbo que se abateu sobre esse dilúvio e sobre os seus mortos. Um segundo dilúvio. Um silêncio sobre silêncio.
Era uma vez um país que se queria sem memória. Ou com uma memória cerceada.
Mas, como diz W. G. Sebald, num magnífico exercício de recuperação da memória — o que é toda a grande literatura senão também uma luta contra o esquecimento e um amparo contra o abismo do tempo? —, «eles também voltam, os mortos.»
O Avanteatro é um lugar de memória, um ponto de encontro de memórias. Aqui se encontra todo um país. Que é um mundo. Do norte e do sul. De mortos e de vivos. De mortos que regressam e de vivos que neles (se) pensam e reflectem.
Ainda W. G. Sebald: «o tempo é só o rumorejar da alma.»
O verdadeiro teatro faz as almas rumorejar, estremecer, vibrar.
O verdadeiro teatro é uma viagem ao interior das nossas emoções e recordações. Desde a obscuridade do tempo traz à luz e partilha momentos efémeros, mas lúcidos, irrepetíveis, mas belos, precários, mas verdadeiros, fugazes, mas livres.
É o que vamos fazer, mais uma vez, no Avanteatro.
Porque é nossa convicção que só a verdade liberta, e só a liberdade é a verdade do homem.