A localização do Espaço Central no novo terreno da Quinta do Cabo foi uma das novidades da Festa deste ano. Se para quem entrou pela Quinta da Princesa pode ter sido estranho chegar à Praça da Paz e não encontrar lá a grande sala de visitas da Festa, com a sua habitual imponência e preponderância, os que optaram pela nova entrada deparavam-se logo com ele, no ponto mais alto do novo terreno, com uma soberana vista sobre a magnífica Baía do Seixal.

Os panos vermelhos que encimavam o Espaço Central remetiam para as bandeiras rubras que desde tempos imemoriais acompanham a luta das classes populares por uma «terra sem amos», que, acompanhadas pela foice e o martelo cruzados e a estrela de cinco pontas, são legítima e orgulhosamente empunhadas pelo Partido Comunista Português.

A proximidade do Espaço Central com o renovado e amplo Espaço Criança conferiu-lhe um ambiente mais familiar do que é habitual e, ao contrário de anos anteriores, em que esteve localizado junto ao Palco Novos Valores e não muito longe do Palco 25 de Abril, este ano o ruído era pouco (e o que existia vinha precisamente dos risos e gritos dos mais pequenos), os debates eram mais audíveis e o descanso… mais descansado. Lá dentro, como habitualmente, as principais exposições, os debates centrais, as artes plásticas, o Cineavante, o espaço «Adere ao PCP», a Loja, o prelo onde durante décadas se produziu a imprensa clandestina, agradáveis zonas de sombra e convívio e o Café da Amizade.

Celebrar a Festa na Festa

Entrando no Espaço Central pelo lado da praça onde pela primeira vez se realizou a Abertura da Festa, na tarde de sexta-feira, com a presença do Secretário-geral, era a grande maqueta da «nova» Festa, com as duas quintas a serem já um único e magnífico terreno, que dominava as atenções. Daí para a exposição evocativa das 40 festas e dos 40 anos da Festa era um pulo.

A abrir, a célebre citação de Álvaro Cunhal na antiga FIL, em 1976, considerando a Festa do Avante! a «mais extraordinária, a mais entusiástica, a mais fraternal e humana jamais realizada no nosso País». Em dezenas de fotografias memoráveis e em pequenos apontamentos de texto lembrava-se os tempos da FIL, do Jamor, da Ajuda, de Loures e as anteriores edições na Atalaia; recordou-se os artistas que por lá passaram – músicos, actores, escritores; valorizou-se a constante e crescente presença da juventude, a qualidade e diversidade das expressões culturais que marcaram quatro décadas de Festa, a solidariedade internacionalista, sempre presente e emocionante, e o desporto, expressão de uma iniciativa sem paralelo no País.

Destaque especial foi dado ao trabalho, ou não fosse a Festa do Avante!, ela própria, um «produto do trabalho empenhado, organizado e militante de milhares de comunistas e amigos do PCP e da Festa que todos os anos a concebem, implantam, promovem, divulgam e fazem funcionar», como se podia ler na exposição. Mas ela é também a Festa do trabalho porque «valoriza, como nenhuma outra, o trabalho e os trabalhadores e dá expressão à alegria, fraternidade, humanismo, solidariedade de classe dos trabalhadores e do povo».

A luta é o caminho

Do outro lado da entrada, mesmo junto à Loja da Festa era possível visitar uma outra exposição, sobre o actual momento político e a proposta e projecto do PCP. À identificação dos principais responsáveis políticos pela situação a que o País chegou – de Mário Soares a Cavaco Silva, passando por António Guterres, Durão Barroso, José Sócrates, Passos Coelho e Paulo Portas – seguia-se a explicitação dos mais graves obstáculos que hoje se colocam ao seu desenvolvimento, de que o volume da dívida pública, a acção predadora da banca privada e os constrangimentos externos avultam como os mais relevantes.

O novo quadro político decorrente da alteração da correlação de forças decorrente dos resultados das eleições legislativas de 4 de Outubro e os avanços que permitiram tinham também expressão na exposição, onde estava impresso o documento da «Posição Conjunta» subscrita pelo PCP e pelo PS. Num dos painéis, citava-se o presidente do Grupo Parlamentar do PCP, João Oliveira, que sobre o Orçamento do Estado para 2016 disse ser o primeiro «sem o cutelo das inconstitucionalidades». Muito embora se sublinhasse o que de positivo foi alcançado pela luta dos trabalhadores e do povo e pela acção determinante do PCP – e tanto e tão importante que foi! –, a exposição punha ainda em evidência as claras limitações da actual solução política. «A luta é o caminho», lia-se em letras garrafais.

Os eixos centrais da política patriótica e de esquerda que o PCP propõe e o seu projecto mais vasto de democracia avançada e socialismo ocupavam parte considerável desta exposição, que destacava os eixos e objectivos centrais da luta dos comunistas portugueses. A realização, em Dezembro, do XX Congresso do Partido surgia igualmente em grande destaque.

Denunciar e derrotar a precariedade
Dramáticos Tempos Modernos

Poucas serão as exposições tão originais e eficazes como a que esteve este ano patente no Espaço Central, intitulada «Precariedade, instabilidade na vida», ilustrada no painel principal, situado ao lado da entrada, com uma imagem de um trabalhador em equilíbrio a limpar os vidros de uma janela, numa situação de flagrante insegurança, que é, afinal, a mesma em que se encontram os trabalhadores com vínculos precários – como seguramente será o caso da pessoa fotografada.

À entrada, o visitante era convidado a guardar um pequeno autocolante vermelho, em forma de círculo, que deveria ser colocado num qualquer ponto do mapa de Portugal situado no interior da exposição que cada um identificasse como uma zona de grande incidência de precariedade laboral. No domingo, o mapa estava praticamente pintado de vermelho… Para entrar na exposição era necessário percorrer um caminho sobre sacos cheios de bolas de esferovite, o que dificultava a caminhada, numa evidente alusão à instabilidade provocada pela precariedade e suas consequências.

Lá dentro, impressos nas paredes ou em depoimentos gravados e transmitidos em ecrãs, estavam patentes precisamente os seus efeitos: horários de trabalho prolongados, vínculos frágeis ou inexistentes, salários baixos, largos períodos de desemprego sem quaisquer subsídios. Um carteiro contratado pelos CTT para uma jornada diária de cinco horas trabalha 10 mas recebe pelo horário contratado; uma auxiliar de acção médica faz turnos consecutivos num hospital público e um trabalhador há 15 anos num mesmo centro de contacto tem um contrato efectivo… com a Empresa de Trabalho Temporário.

Mais adiante, um jogo de janelas quantificava as realidades atrás descritas: 95 por cento dos trabalhadores dos centros de contacto têm vínculos precários, assim como 67,5 por cento dos jovens trabalhadores com menos de 25 anos; o volume de facturação das empresas de trabalho temporário tem vindo a aumentar e em 2015 foi de mais de mil milhões de euros…

Um questionário informático que terminava com um apelo à luta e uma engrenagem «Precariedade/Exploração/ Baixos salários, que podia ser parada, faziam ainda parte da exposição, que terminava com notícias de empresas em que os trabalhadores com vínculos precários, unidos e combativos, conseguiram alterar a sua situação, em muitos casos passando à condição de efectivos: foi o que aconteceu na Sakhti, na Renault Cacia, na Fnac, na Bosch, na Visteon, etc. De tudo isto e muito mais falaram, num debate realizado na sexta-feira no Fórum, os membros da Comissão Política Paulo Raimundo e João Frazão, a deputada Rita Rato e os sindicalistas João Torres e Diogo Correia.

Percorrendo esta exposição, não nos sai da cabeça as imagens do filme de Charles Chaplin «Tempos Modernos», de 1936, transmitido numa televisão instalada ao início do percurso. É a dramática modernidade do capitalismo…

O jornal que dá nome à Festa

Como sempre acontece e este ano de uma forma ainda mais saliente, o Avante! e, em geral, a imprensa do Partido estiveram em destaque no Espaço Central, como um pouco por toda a Festa – aqui principalmente a partir de sábado ao final da tarde, quando dezenas de «camaradas-ardinas» percorreram o terreno a vender a edição especial do órgão central do PCP. Num grande painel colocado no coração do Espaço Central fazia-se uma verdadeira visita guiada ao Avante! que semanalmente chega às mãos de milhares de leitores: a sua condição de jornal partidário comunista, o seu papel de porta-voz da luta dos trabalhadores e do povo, a sua dimensão internacionalista, o de ser o jornal que dá nome à Festa.

A história não foi esquecida, num apontamento que lembrava o percurso acidentado e exaltante do jornal do PCP nos anos da clandestinidade e da Revolução de Abril. A personificar a história estava, como sempre, o prelo – do qual saíram milhares e milhares de páginas de jornais, boletins e folhetos durante os duros anos da ditadura fascista – operado por antigos tipógrafos ou por jovens que têm vindo a aprender o ofício para transmitir esta experiência às gerações futuras. Era este o caso de Rui Garcia, militante comunista na casa dos trinta anos, que ajudou a compor o exemplar do Avante! «clandestino» que era distribuído aos visitantes. Em vários esclarecimentos que prestou a quem por ali passava, explicava como e em que condições «os camaradas tipógrafos» faziam o Avante! e outras publicações clandestinas..

Máscara Ibérica
Expressão da cultura popular

Localizada junto a uma das entradas do Espaço Central, mesmo ao lado do Café da Amizade e de um dos três espaços de debate, a exposição «Máscaras, Rituais da Ibéria» despertou a atenção dos visitantes da Festa, pela sua originalidade e colorido e pela profundidade das explicações que facultava. Muitos não hesitaram em fazer-se fotografar com os manequins que ali se encontravam e em comprar na Loja da Festa réplicas de algumas máscaras.

Expressão da cultura popular em vastas zonas da Península Ibérica, no caso português essencialmente no Nordeste Transmontano e zonas raianas, as máscaras são um elemento essencial dos ritos e folclore de celebrações como a Festa dos Rapazes, a Quarta-feira de Cinzas ou o Carnaval.

Em jornal «Avante!»

 

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