Gala de Ópera
Arte pela arte?! Música apenas beleza dos sons?! Ópera apenas no encanto das melodias, no brilho das vozes, no talento das interpretações?
Uma polémica com décadas a que a realidade e a vida já deram resposta: a qualidade da forma gera a criação do belo e da sua fruição pelo Homem; o iludir do conteúdo e as ideias que o forjam furta a determinante dimensão do Homem à própria criação da beleza.
O texto de João Maria Freitas Branco revela por que é que, neste ano de 2011 – e precisamente neste ano de 2011 – a Festa do «Avante!» renova a beleza deslumbrante da música da sua 2ª Gala de Ópera. E a completa com a majestade da música sinfónica e, sobretudo, o sentimento patriótico de compositores que ressoam hoje na inquietação dos Portugueses com a Pátria que são. Exactamente em 2011.
Ruben de Carvalho
Solistas:
Ana Paula Russo, soprano
Inês Thomas Almeida, meio-soprano
Mário Alves, tenor
João Pedro Cabral, tenor
Luís Rodrigues, barítono
Nuno Dias, baixo
Orquestra Sinfónica do Ginásio Ópera
Coro do Tejo
Coro de Câmara de Lisboa
Direcção Musical: Kodo Yamagishi
Co-produção: Ginásio Ópera, Festa do "Avante!"
É um Portugal afligido por uma das mais profundas crises de toda a sua história que vai acolher a Festa deste ano. Tal facto motiva-nos a cuidar ainda mais do caro torrão lusitano, fomentando o espírito patriótico, não na acepção nacionalista patrioteira inculcada pelo Estado Novo, senão que em sintonia com a elevada noção camoniana de patriotismo. Concepção essa que, ao invés do propagandeado nesse passado ditatorial de triste memória, é factor unitivo, universalizante, elemento fautor de concórdia e diluente de fronteiras, concorrendo para a aproximação dos povos e para o diálogo intercultural.
O autêntico patriotismo é o que, à luz dos valores do humanismo, universaliza as qualidades de uma Nação.
Imbuído deste espírito que a crise convoca, o mega espectáculo de abertura volta a trazer a ópera à Festa, depois do sucesso alcançado em 2009 Mas desta vez a gala é, pela sua dimensão assim como pelo seu conteúdo artístico, bem mais ambiciosa.
O espectáculo oferece-nos original combinação ente dois universos: o da ópera e o da sinfonia. Será por isso gala lírico-sinfónica invulgar, desde logo pela sua rica diversidade: trechos célebres do reportório lírico reúnem-se com outros desconhecidos do não iniciado. Como se isto não bastasse, o programa inclui ainda canções populares e peças corais sinfónicas que não são ópera. Teremos assim, uma articulação não só inédita em espectáculos desta natureza como também de elevada exigência técnico-artística para os seus protagonistas (maestro, cantores, orquestra, coro) Um estimulante desafio que Avante! e Ginásio Ópera (co-produtores do espectáculo) quiseram enfrentar com entusiasmo criativo.
Fazendo jus ao tema eleito, o concerto inicia-se com a Sinfonia à Pátria, obra que traduz em música o patriotismo humanista legado por Camões. Depois entraremos no espaço da ópera com apresentação de variado leque de emoções e sentimentos suscitados pela pátria. Algo que também nos será trazido à presença por intermédio de outras formas artísticas, edificando-se desse modo uma unidade estética entre ópera, música sinfónica, canção popular, música coral.
Queremos acreditar que o concerto será uma novidade propiciadora de mais uma enriquecedora experiência artística a inscrever-se na honrosa tradição cultural a que a Festa do Avante nos habituou.
João Maria de Freitas Branco
Caxias, Junho de 2011
Programa
José Viana da Mota
Sinfonia À Pátria, 1º. andamento
Esta é talvez a obra programática de excelência saída da pena de Viana da Mota, discípulo brilhante de Franz Liszt e um dos mais relevantes pianistas, pedagogos e compositores da música erudita portuguesa.
Giuseppe Verdi
Aida, cena final do 3º. acto
Obra expressamente encomendada, segundo rezam as crónicas, para a abertura do Canal de Suez (1869), ela seria no entanto estreada dois anos mais tarde no Cairo, com enorme êxito. Esta é a famosa cena do final do 3º. acto. Momento de particular intensidade dramática.
Étienne Nicolas Méhul
Le Chant du Départ
De entre as muitas canções patrióticas do período da Revolução Francesa, esta Canção da Partida, cujo significado a situa a par de A Marselhesa, inclui-se entre as mais célebres. Inicialmente conhecida por Hino à Liberdade, o seu título definitivo ter-lhe-á sido atribuído por Robespierre.
Unberto Giordano
Andrea Chénier, "Nemico della Pattria"
Certamente uma das árias mais famosas desta ópera de Giordano (representante destacado do verismo operístico), cuja acção decorre, também, durante a Revolução Francesa.
Ludwig van Beethoven
Fidelio, Coro dos Prisioneiros
Tal como outras criações de Beethoven, a sua única ópera, Fidelio, tem subjacente o turbilhão dos movimentos políticos seus contemporâneos. Um dos momentos altos da obra é o Coro dos Prisioneiros, cantado por um grupo de prisioneiros políticos.
Camille Saint-Saens
Sansão e Dalila, "Mon coeur s' ouvre à ta voix"
Apaixonada declaração de amor de Dalila a Sansão, esta conhecida ária da ópera do compositor francês Saint-Saens é uma das mais belas e intensas páginas de todo o repertório operístico para meio-soprano.
Antonin Dvorák
Going Home, 9ª. Sinfonia, 2º. andamento
Como tantas vezes acontece, há ecos contraditórios acerca da génese deste famoso tema da chamada Sinfonia do Novo Mundo. Será ele baseado num espiritual negro recolhido por Dvorák na sua estadia americana ou deverá afinal a fama à sua posterior apropriação na forma de um hino?
Giacomo Puccini
Tosca, "E lucevan le stelle"
Sem dúvida uma das peças-chave de toda a arte lírica, a belíssima ária do terceiro e último acto desta ópera anuncia o derradeiro encontro entre o revolucionário Cavaradossi e a sua amada Tosca e antecede a execução daquele nas masmorras do Castelo de Sant' Angelo.
Léo Delibes
Lakmé, "Viens Mallika... les lianes en fleurs"
O carácter orientalizante e a delicada orquestração de Delibes são o pano de fundo sobre o qual se destaca este conhecido e exigente dueto para vozes femininas, também conhecido por Dueto das Flores.
Giuseppe Verdi
Don Carlos, "Io vengo a domandar"
Verdi sempre se sentiu atraído pelas questões políticas. Esta sua monumental obra composta para a ópera de Paris e baseada na peça homónima de Schiller chega a ser uma espécie de tratado operístico de política. Neste lindíssimo dueto, paixão amorosa e interesses de Estado entrelaçam-se.
Giuseppe Verdi
Traviata, "Coro di Zingarelle e Mattadori"
Num salão parisiense, um grupo de ciganos baila e canta durante uma festa para entreter os convivas. Brilhante momento de música coral que no entanto é irrelevante para a acção dramática da ópera inspirada em A Dama das Camélias de A.Dumas.
Georges Bizet
Os Pescadores de Pérolas, "Au fond du temple saint"
O tema musical deste dueto reaparece ao longo da ópera como símbolo da amizade que une os dois protagonistas masculinos, sendo exemplificativo da melhor inspiração melódica de Bizet. A acção decorre no Ceilão, na Antiguidade.
Gioachino Rossini
Moisés no Egipto, "Dal tuo stellato soglio"
Tendo conhecido diversas versões e outros títulos, a ópera de Rossini foi estreada na sua forma mais extensa em 1827, na Ópera de Paris. Este trecho, marcado por uma sedutora melodia que vai sendo repetida, é um dos mais célebres da partitura e inspirou mais tarde uma série de variações para violino e piano de Paganini.
Gioachino Rossini
O Barbeiro de Sevilha, "Largo al factotum"
Numa mudança de registo e atmosfera, esta ópera cómica do mesmo Rossini foi inspirada (tal como as Bodas de Fígaro, de Mozart) na chamada "trilogia Fígaro" do dramaturgo francês Beaumarchais. Sendo a primeira intervenção do barítono (a entrada de Fígaro em cena) é ao mesmo tempo a mais célebre ária da ópera.
Wolfgang Amadeus Mozart
Così fan tutte, "Ah, scostati!... Smanie implacabili"
Com libreto de Lorenzo da Ponte, esta famosa opera buffa de Mozart foi estreada em Viena em Janeiro de 1790 e é hoje em dia uma das mais cantadas em todo o Mundo. Esta ária pertence ao 1º. acto e expressa o desespero exaltado de Dorabella (meio-soprano) face à inesperada partida do seu namorado.
Charles Gounod
Fausto, "Un bouquet!... O Dieu! Que de bijoux!"
Uma das mais extensas obras de todo o repertório operístico, livremente baseada na obra homónima de Goethe e estreada em Paris, em Março de 1859. A ária Un bouquet!... O Dieu! Que de bijoux! é um momento de particular relevo para a soprano (Marguerite).
Pietro Mascagni
Cavalaria Rusticana, "Intermezzo"
Este é um expressivo momento orquestral extraído da primeira e mais conhecida ópera composta por Mascagni e também um dos mais famosos e emocionantes intermezzi instrumentais de toda a história da ópera.
Joly Braga Santos
4ª. Sinfonia, 4º. andamento, Hino à Juventude
Na sua versão original esta sinfonia tinha um final puramente orquestral, clímax da obra; mas mais tarde Braga Santos decidiu compor um final coral dedicado às Juventudes Musicais, movimento associativo de que foi um dos fundadores em Portugal (a JMP). Porém, a versão com o epílogo coral é muito raramente executada.
Agustín Lara
Granada
"Prova-de-fogo" para qualquer tenor que se preze, esta famosa canção do compositor mexicano Agustín Lara espelha, da melhor maneira, o carácter inconfundível da música popular espanhola.
Giuseppe Verdi
Nabucco, "Va, pensiero..."
Celebérrimo coro patriótico em que música e povo se unem formando um todo único. Expressão do profundo desejo de liberdade e autonomia do povo italiano em meados do século XIX. Verdi estabelece um paralelo entre a situação dos hebreus oprimidos no tempo de Nabucodonosor e a do povo italiano do seu tempo. Isso lhe irá conferir de imediato enorme fama, prestígio e o estatuto de primeiro grande compositor de Itália.